A mudança é sempre dolorosa e exige
demais de nós. Sempre iremos nos sentir atormentados quando os parâmetros que
nos guiavam, e nos ajudavam a possuir uma perspectiva exata sobre as coisas,
simplesmente são pulverizados, sucumbindo a um novo arranjo que nos mostra o
quanto aquilo em que acreditávamos era incoerente, irreal, obrigando-nos a
adquirir uma nova interpretação para as coisas, obrigando-nos a alterar nossa
estrutura particular e subjetiva, e, consequentemente, alterando nossos
desejos, metas, preferências, reações, comportamento... sendo mais específico:
alterando-nos por completo.
Durante
os períodos de mudança, onde uma alteração conceitual faz com que passemos a
observar as coisas de uma forma completamente diferente – fazendo com que o
mundo adquira nuances nunca antes imaginadas por nós –, constantemente nos
sentimos irremediavelmente desesperados, aspecto esse que incita atitudes
intensas, resoluções violentas. É somente nesses períodos de mudança que
percebemos o quanto nossos mecanismos de proteção são importantes; apenas nos
momentos mais sombrios e desesperadores – onde uma nova concepção, falha e mal
estruturada, não impede que nossa imaginação crie os cenários mais deploráveis,
insuportavelmente assustadores – que percebemos o quanto são indispensáveis nossas
ilusões e interpretações capciosas, que visam, a todo custo, impedir que nos
deparemos com tais momentos obscuros e dolorosos.
Entretanto,
quando não estamos devidamente protegidos, ou quando olhamos desatentamente
para algo previamente bem elaborado na nossa mente – analisando-o sob novas
perspectivas e designando novas possibilidades àquilo que antes era exato e
único –, podemos adquirir uma perspectiva completamente nova, que nos mostra
aspectos muito mais coerentes do que nossas crenças anteriores, fazendo com que
desconstruamos aquilo que anteriormente era considerado como sendo exato,
inquestionável e irrefutável.
Em
meio aos destroços de uma mentalidade anteriormente bem definida, torna-se
evidente o quanto eram incoerentes e insuficientes as relações que nos pareciam
inquestionáveis. Despidas do exagero, provido por nossa imaginação, tudo aquilo
que nos motivava e dava sentido torna-se insosso, ridículo. Ao mesmo tempo que
percebemos isso, notamos o quanto nosso inconsciente se esforça para
estabelecer uma estrutura exata, uma correlação irrefutável, daquilo que
percebemos.
Durante
os primeiros dias de desconstrução, cada hora de sono é vista como sendo um
alívio abrangente, um momento de salvação perante o desespero sem fim de um
mundo desconexo. Ao acordar, nossos pensamentos e conceitos estão bem
estruturados e definidos, cada acontecimento passa a ter, novamente, relação
com parâmetros bem definidos, bem delimitados, não mais proporcionando
associações descontroladas e exageradas. Essa serenidade reconfortante faz com
que nos sintamos mais satisfeitos, mais potentes; nosso desejo mais profundo
seria a manutenção de tal estado, mas nossa consciência não nos permite isso.
Após um breve momento, os parâmetros bem estruturados durante o sono são
novamente questionados através de novas perspectivas, fazendo com que,
novamente, aquilo que nos guiava seja destruído.
Um
arranjo, antes tão exato, volta a possuir múltiplas interpretações, sendo,
através de aspectos discrepantes, desconstruído. Concomitantemente com a perda
de nossas estruturas exatas, somos acometidos por pensamentos assustadores,
que, na ausência de estruturas exatas e mecanismos de proteção, vagam
profundamente, e incessantemente, pela nossa mente.
Os
cenários com os quais nos deparamos, que foram analisados pela nossa
imaginação, parecem ser milhões de vezes mais dolorosos do que a morte,
incitando, desse modo, o desejo de que a dor dilacerante se encerre com o
suicídio. Essa alternativa é intrínseca a uma mentalidade exímia em
desconstruir, sendo, muitas vezes, a única saída possível para o desespero sem
fim. Mas, mesmo essa única solução pode gerar ainda mais dor... Ao se propor a
executar a única solução satisfatória, a mente, que desenvolve cenários e consequências
em lugares situados muito além do nosso controle e consciência, elabora consequências
para esse ato que nos deparemos com cenários mais dolorosos e desesperadores do
que aqueles que nos incomodavam anteriormente.
Todo
esse conflito interno, toda essa dor, incita todo tipo possível solução que
promete amenizar e afugentar aquilo que nos atormenta. Isso, que considerar
como uma válvula de escape, geralmente é direcionado para a sexualidade, não
sendo essa, necessariamente, a única alternativa para que façamos com que o
cenário em nossa mente se torne menos assustador.
Após
essa breve análise sobre a desconstrução de nossos ideais, não é de se espantar
que as pessoas afugentem, com todas as suas forças, qualquer tipo de conceito
ou questionamento que destrua suas crenças, seus conteúdos bem definidos que as
direcionam durante a vida.