Olho para ela, da mesma forma que olhava antes, mas não consigo sentir o
mesmo que antes. Alguma coisa aconteceu... Em algum momento tudo se alterou, e
não mais senti que éramos parecidos, ou que poderíamos nos ajudar mutuamente
para que conseguíssemos acelerar nossa busca por autoconhecimento, só pode ter
acontecido isso. Agora nos olhamos como estranhos, que não compartilham nada em
comum.
É até engraçado pensarmos no quanto a vida se renova e é incerta. Às
vezes, temos de nos ater veementemente a uma concepção, não permitindo que ela
seja questionada, assim como não devemos nos lembrar dela a todo o momento,
policiando-nos, constantemente, para que aquilo que pensamos e valorizamos não
seja perdido, não seja desconstruído pela realidade. Eu afirmo isso por experiência
própria, mesmo correndo o risco de ser taxado como iludido que se prende ao
passado.
Nessa interação, anteriormente especial, que agora esvaneceu num átimo,
acho que mão me atei a conceitos antigos, e esse foi o meu erro. Durante minha
vida conturbada, deparei-me com situações que exigiram toda a minha
concentração e o meu esforço. Quando voltei a encontrar ela, após nem um ano em
que estivemos separados, já não me lembrava, com precisão, das características
que tanto me encantavam, e, olhando-a com um olhar cheio de curiosidade e
esperança, não reconheci aquela pessoa que eu estimava muito, mas muito pelo
contrário, encontrei alguém que me enojou.
Enxergar demais e não se ater a concepções idealistas são problemas
grandiosos. Uma das poucas pessoas que me agradava, hoje não mais suscita algo
em mim.
As coisas à nossa volta estão mudando em um ritmo alucinante. Eu
realmente gostaria de não enxergar tanto, para que pudesse possuir conceitos
imutáveis, que me agradassem de alguma forma. Essa minha constituição
flutuante, que sempre me permite enxergar tudo à minha volta, faz com que eu
desconstrua, constantemente, meus conceitos e sinta nojo de todas as pessoas
com as quais mantenho relações. Se enxergasse menos, eu poderia ter um
relacionamento limitado e supérfluo, que duraria muito tempo e, com a ajuda da
minha imaginação, poderia até mesmo me satisfazer.
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